No último domingo, dia 24, assisti pela TV Brasil o documentário Muda Brasil! (CALDEIRA, Oswaldo. 1985), que trata dos bastidores das eleições indiretas para presidente do Brasil, após vinte anos de Ditadura militar. Nesta obra, o que muito me interessou foi ver os discursos de certas figurinhas políticas, hoje, carimbadas.
Lula, atual presidente, dizendo que não apoiava nenhuma das duas candidaturas postas não por causa da ilegitimidade, amoralidade do processo, mas “porque nenhuma representava os interesses da classe trabalhadora”. O que o tempo não faz com as pessoas...
Além dele, Fernando Henrique Cardoso (PMDB) e Marco Maciel (PDS) em trincheiras diferentes naquelas eleições – e pensar que o segundo foi vice-presidente do primeiro anos depois. Além do aparecimento de figuras como Ibrahim Moraes, Leonel Brizola, Ulysses Guimarães e tantos outros que “continuaram” em Brasília.
Mas os protagonistas do filme são Antônio Carlos Magalhães e Paulo Salim Maluf. Pois é, mais até do que o fenômeno de popularidade Tancredo Neves – que me lembra Barack Obama pelas utópicas esperanças.
Logo no início aparecem as convenções do partido da ditadura, o PDS, que gastou “bilhões de cruzeiros” (imagino que milhões de reais) com secretárias, panfletos, faixas e comprando votos de partidários.
Pelo que se diz no documentário, Tancredo preferia enfrentar Paulo Maluf a André As – cujo candidato a vice era o então governador de Alagoas Divaldo Suruagy, que dez anos depois foi protagonista de um dos piores momentos da história local. O motivo era simples: Maluf já era conhecido como político corrupto e dividia opiniões no PDS.
E alguns foram os depoimentos de pessoas que tiveram propostas para ganharem panfletos em eleições futuras para que Maluf ganhasse. E ele ganhou. É incrível o quanto bom de enrolação é esse cara.
Assim que acabou a votação do partido e a sua vitória foi anunciada, começou-se a cantar o Hino Nacional, como se aquela tivesse sido uma vitória da Nação. E isso justamente das frentes que representavam a continuidade da Ditadura! Hipocrisia pura.
A divisão então criada repartiu o PDS em três. O grupo dos candidatos derrotados, cerca de 53 senadores/deputados (segundo eles), optou por se manter distante das eleições, não apoiando nenhum dos dois grupos. Porém, outro grupo optou por participar da Frente Liberal encabeçada por Tancredo Neves e que deu a José Sarney a candidatura a vice-presidência.
ACM estava nestes últimos citados e foi o responsável por uma das maiores quebras-de-braço entre raposas políticas de tal nível – capazes de fazer de TUDO por uma vitória.
Em viagem a Salvador ao lado do presidente militar João Baptista Figueiredo, que lançaria uma obra, Paulo Maluf viu seu adversário marcar uma grande festa para o mesmo dia. Além disso, tanto ele quanto Figueiredo foram bastante hostilizados no lançamento. Mas, Maluf não viu nada disso: “Muitas pessoas estavam lá para nos apoiar”!
Enquanto isso, Tancredo Neves rodava o Brasil em busca de apoio. Começando por Minas Gerais, de passagem por São Paulo, onde ganhara apoio do governador Franco Montoro e de FHC (volta da política do café-com-leite), Goiás, Amazonas, Pará...
Em Manaus um fato inusitado ocorreu. Os militares já haviam “colocado” pessoas com camisas vermelhas em comício de Tancredo em São Paulo, para interligar sua imagem ao comunismo. Além de existir setores de esquerda que os apoiavam, algumas pessoas em Manaus foram com camisa vermelha e foram hostilizadas por partidários do próprio candidato. A polícia foi chamada por eles para tirar os “comunistas” dali.
Grande demonstração de pluripartidarismo e defesa da liberdade de ideologia!
Maluf e ACM continuavam a se estranhar por meio de notas à imprensa. ACM, nos discursos que fazia com Tancredo pelo país, fazia questão de deixar claro que o país não poderia votar em corruptos, que o candidato adversário era ladrão – por mais absurdo que algo assim tenha saído dele.
Quando questionado por repórteres em seu escritório sobre isso, Maluf pediu para que falassem com o seu advogado, que entraria com um processo contra ele. Aí os repórteres diziam que ACM prometera mostrar que ele era corrupto através de provas. “Falem com meu advogado...”. ACM também iria entrar na justiça contra ele. “Falem com meu advogado...”
Em outro momento, ele claramente direciona uma entrevista, pedindo para que alguém mais próximo a ele fale porque assim a voz ficará mais forte: “Agora, fale um pouco mais alto. Outra pessoa. Não, não, tem que ser alguém mais perto, senão não fica bom”.
Em meio ao racha no PDS, que faria criar posteriormente o PFL (atual DEM), Maluf fala à imprensa que congressistas do PMDB votariam nele, só não poderia precisar os votos. Mais uma tentativa descarada de enganar a tudo e a todos.
No final, nem mais uma enxurrada de tentativas de compra de votos adiantou para ele. Tancredo Neves era eleito presidente do Brasil com a grande expectativa para fazer do seu lema Muda Brasil! uma realidade. Mal sabia ele o que aconteceria depois...
4 comentários:
Olha o Anderson fazendo sua estréia! \o/
Não vi esse documentário, que pelo seu post fala do momento da Redemocratização e da eleição de Tancredo Neves - sim, o nosso Barack Obama; boa analogia!
Mas em "Brazil: Beyond Citizen Kane" o Lula já faz uma intervenção sobre a Globo e o Roberto Marinho que dificilmente usaria nos dias atuais.
E é bom lembrar que quando da morte do Mandatário da Rede Globo, em 2003, foi decretado luto oficial por parte do governo federal...
A preocupação de Lula e do PT com os "interesses da classe trabalhadora" mudou sensivelmente.
hm... bom post.. tenho uma ressalva:"cujo candidato a vice era o então governador de Alagoas Divaldo Suruagy, que dez anos depois foi protagonista de um dos piores momentos da história local."
Eu só acho que foi um dos melhores momentos da história local, rs...
explico:
Do ponto de vista da classe dominante, foi sim um dos piores momentos da história de Alagoas. Do ponto de vista da luta dos trabalhadores aquilo foi... lindo!
Afinal não é todo dia que rola uma insurreição por conta da luta dos trabalhadores, neh!
Foi uma grande mobilização mesmo, pena q só vi pela TV pq não morava aqui.
O único problema foi quem apareceu ainda mais a partir dali, casos de Lessa e Kátia.
e Heloísa Helena, rsrsrs...
dando um pelo outro num tem troco.
Mas isso já aconteceu em vários momentos, a revolução iraniana, em 1972, tinha uma disputa pela direção do movimento, entre os socialistas e os islâmicos, durante as revoluções que derrubaram as ditaduras burocráticas do Leste Europeu e da URSS, quem acabou dirigindo o processo depois foi o setor da burguesia mais ligado à burocracia(Ieltsin). O fora collor, dirigido pelo PC do B(Juventude) e pelo PT que era contra o fora collor.
A vida é assim... os revolucionários precisam sempre disputar a direção...